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RESGATE

Voluntários iniciam trabalhos de restauração em histórica escola de região

Construída há mais de 150 anos, prédio está em ruínas mas guarda memórias de antigos alunos

Dário Gonçalves
Publicado em: 01/11/2023 às 16h:04 Última atualização: 14/11/2023 às 16h:10
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Incluso no Ivoti 100, conjunto de ações com o objetivo de traçar estratégias para os próximos anos na cidade, encontra-se um projeto de valorização do patrimônio histórico que envolve a restauração do que se acredita ser a primeira escola do município. Conhecida como “Escolinha Rui Barbosa”, esta instituição está localizada na região de 48 Alta, que posteriormente passou a ser denominada Escola Municipal Nicolau Frederico Kunrath.

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Há cerca de 70 anos, Julita foi uma das alunas da Escolinha Rui Barbosa | Jornal NH



Há cerca de 70 anos, Julita foi uma das alunas da Escolinha Rui Barbosa

Foto: Dário Gonçalves/GES-Especial

Em 2021, a voluntária Irene Rosany Mieth, que faz parte do Ivoti 100, visitou uma empreiteira que se disponibilizou a executar a obra de restauro na escolinha. A família proprietária do imóvel também foi procurada e autorizou a execução após reuniões com os voluntários e a prefeitura.

Então, nos dias 14 e 21 de outubro deste ano, membros voluntários da Associação dos Profissionais de Engenharia e Arquitetura de Ivoti (APEAI) uniram forças em um mutirão de limpeza e levantamento de medidas na edificação. “Estamos na fase da limpeza, porque choveu muito. Depois vem o projeto, cuja execução será pela Lauri Empreiteira, sem custos. Os materiais, buscaremos através de doações na comunidade”, explica Mieth.

O restauro será feito de forma lenta, uma vez que a casa foi construída ainda no século XIX e encontra-se em um estado precário de preservação. As paredes de pedra contém rachaduras e risco de desabar. O telhado é desgastado e aberto, e o assoalho de madeira também apresenta-se podre. “Precisamos preservar o máximo possível a identidade da obra. Vai ter muitas mãos voluntárias para recuperar a primeira escola de Ivoti”, acrescenta Mieth.

O principal objetivo do restauro é transformar a antiga escola em um museu ou memorial, equipado com mobiliários e elementos da época, permitindo a visitação do público em geral. Em uma rede social, a arquiteta Taciana Muller, que integra o grupo de voluntários da APEAI, explicou que o restauro deve reconstituir o contexto autêntico da obra, “sem perder os legítimos traços arquitetônicos ou cometer um falso histórico que possa anular as linhas da passagem do tempo sobre a obra”.



Primeira escola de Ivoti?

O historiador local, Cristiano de Brum, que atuou como voluntário do mutirão de limpeza, conta que é muito difícil comprovar que esta seja a primeira escola da cidade, mas que é o que se conta. “Antigamente não existia o município de Ivoti. Ela era a escola da Picada 48, e mesmo se não for a primeira, isso não tira o valor dela. Existem registros de um viajante irlandês que passou no local em 1871”, conta.

A edificação histórica foi construída no século XIX e é citada no livro “O Rio Grande do Sul e suas Colônias Alemãs”, do escritor e jornalista irlandês Michael George Mulhall, de 1873, traduzido para o português em 1974. O relato narra o momento em que o viajante passava pela estrada do “Acht-und-Vierzig” (quarenta e oito, em alemão) em 1871, partindo de Dois Irmãos. Passando nas imediações da atual Rua do Moinho, Mullhall descreve o seguinte: “Em cima do penedo havia casas de ‘fazenda’ invisíveis para nós e mais ao longe vimos alguns meninos com suas sacolas escolares, fazendo a pé o trajeto para o colégio de ‘Achtundvierzig’”, escreveu.

A escola chamava-se Rui Barbosa, conforme arquivos cedidos por Brum, e atendia alunos não só da Picada 48, mas também do interior de Dois Irmãos e Picada Café (que incluía Picada Feijão). Em 1960, a escolinha foi desativada, pois o prédio, de apenas 26m², não comportava mais o número de alunos. Na época, Estância Velha, da qual Ivoti era distrito, foi beneficiada pelo projeto educacional do governador Leonel Brizola, com a construção das Brizoletas, sendo uma destinada à Picada 48 Alta, no local onde hoje se encontra a atual Escola Municipal Nicolau Frederico Kunrath. O nome é em homenagem ao professor Kunrath, que lecionou na escolinha de 1949 a 1963.

Lembranças de um tempo que não volta

Por cinco anos, Julita Arnecke, hoje com 77 anos, foi aluna da Escolinha Rui Barbosa e do professor Nicolau Frederico Kunrath durante a década de 1950. Ela lembra com carinho e nostalgia de um tempo em que morava em 48 Alta e caminhava cerca de meia hora até a escola.

Com o caderno na sacola, chegava por uma estrada de chão, com a metade da largura da atual Rua São João. Chegava sempre antes do professor, o qual ela descreve como rigoroso, e ficava esperando ele chegar a cavalo. “Era uma escola bonitinha, inteira, mas sem vidraça nas janelas. O professor amarrava o cavalo aqui na frente, ou pedia para algum aluno levá-lo até um potreiro que ficava há uns 50 metros para trás da escola”, relembra.



Na época, não havia divisão por séries, todas as crianças ficavam juntas. “Chegou a ter mais de 50 alunos aqui dentro de uma só vez.”, conta. Sem energia elétrica, nos dias de chuva em que as janelas e portas precisavam ser fechadas, a sala ficava escura. Mas quando tinha sol, as crianças aproveitavam o recreio para sentar na beira da estrada para comer frutas e brincar, enquanto o professor tomava chimarrão com vizinhos.

Aos fundos da escola havia uma “capunga”, também conhecida como patente, que era o banheiro dos alunos. Porém, não havia papel higiênico. “Todo mundo tinha o mesmo cheiro. Algumas pessoas dizem para não contar essa parte, mas eu gosto de contar porque é a nossa história”, afirma. Na parte da frente, uma cisterna era usada para lavar as mãos e uma toalha branca era disponibilizada. Aos finais de semana, cada aluno a levava para lavar em casa.

Como única escola da região na época, Julita foi colega da própria irmã, Malda Olívia Weber, que é um ano mais velha. Arno Weber, hoje com 85 anos, é irmão das duas, e também foi aluno na escola Rui Barbosa.

Fundos da escolinha Rui Barbosa | Jornal NH



Fundos da escolinha Rui Barbosa

Foto: Dário Gonçalves/GES-Especial

Aos 74 anos, Marlise Maria Rheinheimer também tem lembranças de quando foi aluna da escolinha entre 1954 e 1955. Na época com sete anos, ela foi colega de sala de Julita, que é sua prima, mas estudavam em séries diferentes. Cada fileira de bancos representava um ano escolar.

“Fiz até o segundo ano nesta escola e era pequena. O professor era rígido, chegamos a levar uma varada na palma da mão. Ele ensinava em português, mas a gente só falava em alemão e tinha dificuldade de entender. Quando ele se irritava, ou os alunos ficavam conversando, vinha as varadas.”, recorda aos risos.

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